RMMG - Revista Médica de Minas Gerais

Volume: 33 e-33102 DOI: https://dx.doi.org/10.5935/2238-3182.2023e33102

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Artigo Original

Descrição das características clínicas e epidemiológicas de pacientes pediátricos internados e diagnosticados com COVID-19

Description of clinical and epidemiological features of hospitalized pediatric patients diagnosed with COVID-19

Dayra Aparecida de Almeida Pinheiro1; Eliza Lavall Bamberg1; Ana Clara Ribeiro de Barros Pereira1; Fábio Videira Chagas1; Sílvia Paschoalini Azalim de Castro1,2

1. Hospital Regional João Penido/FHEMIG. Juiz de Fora, Minas Gerais, Brasil
2. Universidade Federal de Minas Gerais. Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil

Endereço para correspondência

Dayra Aparecida de Almeida Pinheiro
E-mail: daayra_@hotmail.com

Recebido em: 17 Janeiro 2022
Aprovado em: 18 Novembro 2022
Data de Publicação: 08 Março 2023

Editor Associado Responsável:

Dr. Alexandre Moura
Santa Casa de Misericórdia de Belo Horizonte
Belo Horizonte/MG, Brasil

Fontes apoiadoras: Não há

Conflito de Interesse: Não há

Comitê de Ética: Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais - FHEMIG, sob o número de protocolo CAAE 41205020.1.0000.5119

Registro de Ensaio Clínico: Não se aplica

URL do Preprint: Não se aplica

Resumo

INTRODUÇÃO: Apesar da disseminação mundial da COVID-19, os padrões epidemiológicos e clínicos da doença ainda permanecem incertos na faixa etária pediátrica.
OBJETIVO: Descrever as características epidemiológicas, clínicas, laboratoriais e radiológicas dos pacientes pediátricos diagnosticados com doença causada pelo SARS-CoV-2, hospitalizados na enfermaria do Hospital Regional João Penido, situado em Juiz de Fora/MG.
MÉTODOS: Foi realizado um estudo do tipo coorte, com coleta de dados do período da internação referente a critérios epidemiológicos, clínicos, laboratoriais e radiológicos através de formulário próprio desenvolvido para a pesquisa de pacientes pediátricos hospitalizados no período de 11 de março de 2020 até 11 de março de 2021, que receberam diagnóstico de COVID-19, confirmado por RT-PCR ou por sorologia IgM/IgG.
RESULTADOS: Dos pacientes com COVID-19, 49,2% tinham idade até 3 anos, 66,2% eram do sexo masculino e, dentre as comorbidades, doença respiratória crônica foi a de maior prevalência (26,9%). A maioria dos pacientes apresentou quadro clínico respiratório (72,7%). Com relação à gravidade da doença, 38,5% apresentaram doença leve, 23,1% moderada, 23,1% grave e 12,3% crítica. No desfecho, 98,5% tiveram alta hospitalar e apenas 1 paciente, que possuía diversas comorbidades, evoluiu a óbito.
CONCLUSÃO: A COVID-19 possui apresentações clínicas, radiológicas e laboratoriais variadas e, não existindo tratamento único ou específico, os casos devem ser analisados e conduzidos de forma individual.

Palavras-chave: Coronavírus; COVID-19; Pediatria.

 

INTRODUÇÃO

Os coronavírus pertencem à família Coronaviridae, ordem Nidovirales, e são divididos em quatro gêneros: α-, β-, γ- e δ-coronavírus. Os a- e β-coronavírus infectam apenas mamíferos1. Entre os coronavírus patogênicos para os seres humanos, a maioria está associada a sintomas clínicos leves, com duas exceções: os coronavírus causadores da síndrome respiratória aguda grave (SARS-CoV), um beta-coronavírus que surgiu em 2002, e resultou em mais de 8.000 infecções humanas e 774 mortes em 37 países entre 2002 e 2003, e o coronavírus da síndrome respiratória do Oriente Médio (MERS-CoV), detectado pela primeira vez em 2012 e responsável por 2.494 casos de infecção confirmados em laboratório e 858 fatalidades desde setembro de 20121-3.

Em dezembro de 2019, uma série de casos de pneumonia de causa desconhecida surgiu em Wuhan, Hubei, China, com apresentações clínicas muito semelhantes a uma pneumonia viral. A análise de sequenciamento de amostras do trato respiratório inferior indicou um novo coronavírus, pertencente ao gênero β-coronavírus, que foi nomeado de SARS-CoV-21,3-6.

Estudos epidemiológicos evidenciam que pacientes com comorbidades ou com mais de 60 anos apresentam maiores chances de complicações e que o SARS-CoV-2 tem grande potencial infeccioso, sendo os pacientes infectados a principal fonte de transmissibilidade, mesmo quando assintomáticos1,5,7. No entanto, a faixa etária pediátrica não se comportou como grupo de risco, exceto a evidência de menores de 1 (um) ano com maiores chances de complicações1,3,8.

Em comparação às características clínicas dos casos em adultos, a maioria das crianças diagnosticadas com a doença tem sintomatologia mais leve, se recupera mais rapidamente, o tempo de transmissão é mais curto e o prognóstico é bom7,8. Quando sintomáticas, febre e tosse são os mais comuns, mas o espectro de sintomas pode incluir ainda fadiga, mialgia, congestão nasal, coriza, espirros, odinofagia, cefaleia, tontura, náusea, vômito, dor abdominal e diarreia3,7. A maioria das crianças será conduzida ambulatorialmente, pois os casos assintomáticos, leves ou moderados compreendem cerca de 97% dos casos9, mas se presentes sinais e sintomas clínicos sugestivos de gravidade haverá indicação de internação clínica10, sendo cerca de 3% o número de casos graves e críticos com maior risco de complicação9.

Apesar da disseminação mundial, os padrões epidemiológicos e clínicos da COVID-19 ainda permanecem incertos na faixa etária pediátrica, e estudos epidemiológicos são necessários para o conhecimento e a descrição das características clínicas, laboratoriais e radiológicas dos pacientes pediátricos internados.

 

MÉTODOS

Foi realizado um estudo do tipo coorte prospectivo, após aprovação pelo Comitê de Ética e Pesquisa (CEP) da Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais (FHEMIG) sob o parecer consubstanciado nº 41205020.1.0000.5119.

A amostra foi composta por 65 pacientes pediátricos hospitalizados na enfermaria do Hospital Regional João Penido (HRJP), em Juiz de Fora/MG, sendo a unidade de referência para internação de pacientes pediátricos na Zona da Mata Mineira, composta por 23 leitos; com diagnóstico de SARS-CoV-2 confirmado por RT-PCR (reação da transcriptase reversa seguida pela reação em cadeia da polimerase) ou por sorologia IgM/IgG quantitativa, no período de 11 março de 2020 até 11 de março de 2021, contemplando o primeiro ano da pandemia de COVID-19.

As informações foram coletadas em formulário próprio desenvolvido para a pesquisa através da busca em prontuário eletrônico no Sistema Integrado de Gestão Hospitalar (SIGH/Intranet). Os dados passaram por uma análise univariada a partir de critérios epidemiológicos (idade, sexo, etnia e local de residência - bairro/cidade), clínicos (presença de comorbidades, principal quadro clínico na apresentação e demais sinais e sintomas), laboratoriais e radiológicos, tratamento e duração da internação.

A partir do levantamento de dados, a doença foi classificada de acordo com a gravidade. Os casos leves foram aqueles que não apresentaram taquipneia, esforço respiratório, queda de saturação de oxigênio (SatO2) ou necessidade de oxigenioterapia. Os casos moderados, os que apresentaram taquipneia, sibilância, esforço respiratório discreto, porém, sem queda de SatO2 abaixo de 92%. Foram considerados casos graves, os que apresentaram esforço respiratório de moderado a grave e SatO2 abaixo de 92%. E, casos críticos, foram aqueles que apresentaram evolução rápida para a síndrome respiratória aguda grave ou insuficiência respiratória e foram encaminhados para unidade de terapia intensiva (UTI)1.

 

RESULTADOS

Dos 65 pacientes internados confirmados para COVID-19, 63 (97%) foram por RT-PCR e 2 (3%) por sorologia IgM/IgG. Os pacientes do sexo masculino eram 43 (66,2%), enquanto 22 (33,8%) eram do sexo feminino; com idades entre 1 dia e 13 anos e 1 mês de vida.

Foi observado o perfil epidemiológico conforme mostrado na Tabela 1 e, também, o município de residência destes, sendo que 9 (13,9%) residiam em outras cidades e os demais 56 (86,1%) eram residentes de Juiz de Fora/MG, tendo sua distribuição por bairros demonstrada no mapa representado pela Figura 1.

 

 

 


Figura 1. Mapa de distribuição de bairros de Juiz de Fora/MG que tiveram pacientes com COVID-19.
Fonte: Imagem retirada do Google Maps, a partir de dados coletados para a pesquisa pelos autores.

 

Os pacientes da amostra foram encaminhados de diferentes serviços de saúde, sendo que 52 (80%) foram transferidos de unidades de pronto atendimento, 6 (9,2%) de UTI, 5 (7,8%) de outra unidade hospitalar, 1 (1,5%) de alojamento conjunto de maternidade e 1 (1,5%) já se encontrava internado na enfermaria do HRJP para tratamento de outra enfermidade. 46 (70,8%) pacientes apresentavam menos de 5 dias de sintomas no momento da internação, 15 (23%) apresentavam entre 5 e 10 dias de sintomas e 4 (6,2%) apresentavam mais de 10 dias de sintomas. As comorbidades relatadas podem ser analisadas na Tabela 2.

 

 

Dos pacientes internados, 20 (30,8%) relataram contato com indivíduo com COVID-19 positivo em domicílio, 42 (64,6%) relataram que demais familiares eram assintomáticos e não souberam precisar local de contágio; 3 (4,6%) apresentaram exame (swab de secreção nasal com pesquisa de RT-PCR para SARS-CoV-2) positivo com menos de 24 horas de vida e eram filhos de mães com história de COVID-19 em algum momento da gestação, sugerindo transmissão vertical.

Foram identificados 10 principais quadros clínicos durante a internação: 47 (72,7%) apresentavam quadro respiratório, 8 (12,3%) apresentavam quadro gastrointestinal, 3 (4,5%) apresentavam quadro neurológico, 2 (3%) eram assintomáticos, e dos seguintes quadros - condição similar à doença de Kawasaki (DK), disfunção cardíaca aguda, dermatológico, urinário e crise álgica, foi observado apenas 1 (1,5%) paciente de cada. Os pacientes foram divididos de acordo com os seus sinais e sintomas, conforme as Tabelas 3 e 4.

 

 

 

 

Diversos exames complementares foram realizados durante a internação, no entanto, durante a coleta de dados foram considerados apenas os exames da admissão hospitalar. As medianas dos resultados desses exames foram descritas na Tabela 5.

 

 

Em relação aos exames de imagem, 34 (52,3%) pacientes tiveram radiografia de tórax sem alterações, 9 (13,8%) não realizaram o exame e, 22 (33,9%) tiveram alterações, das quais: 9 (40,9%) com consolidação, 6 (27,3%) com infiltrado intersticial localizado, 5 (22,7%) com infiltrado intersticial difuso bilateral, 3 (13,6%) com atelectasia, 3 (13,6%) com derrame pleural e 3 (13,6%) com hiperinsuflação. Tomografia computadorizada (TC) de tórax foi realizada em 17 (26,2%) pacientes, dos quais 11 (64,7%) apresentaram padrão de opacidade em vidro fosco.

Foi necessário a oferta de oxigênio suplementar em 28 (43,1%) pacientes através de vários dispositivos, tais como cateter nasal em 15 (53,6%) indivíduos, máscara com reservatório em 6 (21,5%), ventilação mecânica invasiva em 3 (10,7%) - 2 pacientes com intubação orotraqueal e 1 já previamente traqueostomizada, máscara simples em 2 (7,1%) e ventilação não-invasiva com aplicação de pressão positiva em 2 (7,1%). Quanto à duração da oxigenoterapia, 8 (28,6%) pacientes usaram por menos de 48 horas, 13 (46,4%) usaram entre 2 e 5 dias e 7 (25%) usaram por mais de 5 dias.

Na amostra avaliada, 2 (3%) pacientes foram assintomáticos e, dentre os sintomáticos, a doença foi classificada de acordo com a gravidade: 25 (38,5%) tiveram quadro leve, 15 (23,1%) tiveram quadro moderado, 15 (23,1%) tiveram quadro grave e 8 (12,3%) tiveram quadro crítico.

Com relação ao tratamento farmacológico, foi empregada antibioticoterapia, sendo que a azitromicina foi utilizada em 69,2% dos pacientes, a ceftriaxona em 37,9% e a amoxicilina + clavulanato em 27,6%, outros antibióticos foram necessários de acordo com a gravidade e resultados de culturas. O medicamento oseltamivir foi utilizado em 34 (52,3%) pacientes. Em outros 4 (6,2%), foi necessário associar antifúngico: 2 (50%) utilizaram nistatina solução e 2 (50%) utilizaram anfotericina B. Foi realizada, também, corticoterapia em 41 (63,1%) pacientes. A hidroxicloroquina não foi empregada na amostra. O medicamento salbutamol aerossol foi utilizado em 37 (56,9%) pacientes.

A duração da internação foi variada: 15 (23,1%) pacientes permaneceram por menos de 3 dias em unidade hospitalar, 32 (49,2%) permaneceram entre 3 e 7 dias, e 18 (27,7%) necessitaram de mais de 7 dias de internação. Apenas 3 pacientes (4,5%) foram transferidos da enfermaria para a UTI, com posterior retorno de 2 destes para o setor. Em relação ao desfecho, 64 (98,5%) tiveram alta hospitalar do HRJP. Apenas 1 paciente, que possuía como comorbidades toxoplasmose congênita, laringomalácia congênita com acentuado desconforto respiratório, hipoaldosteronismo/pseudohipoaldosteronismo e atraso do desenvolvimento neuropsicomotor teve desfecho desfavorável, evoluindo com óbito.

 

DISCUSSÃO

Observou-se que crianças menores de 3 anos de idade representaram a maioria dos indivíduos internados (49,2%), o que condiz com o encontrado na literatura, na qual crianças menores de 2 anos são grupo de risco11,12. Houve também um predomínio no sexo masculino, representando 66,2% dos casos. De acordo com Mjaess et al. (2020)13, a predominância no sexo masculino ainda não está bem esclarecida, porém, há indícios de que o estrogênio pode ter efeito protetor contra a infecção por coronavírus. Além disso, a própria patogenicidade viral pode ser responsável por essa diferença, pois a infectividade do coronavírus depende da ligação de sua proteína de pico viral ao receptor da enzima conversora de angiotensina 2 (ECA2), e que há um aumento da expressão de ECA2 em indivíduos do sexo masculino13. Em relação à etnia, não houve uma diferença significativa entre os grupos; e quanto à distribuição territorial, houve uma distribuição homogênea entre os bairros da cidade, sem predomínio de alguma região.

A maioria dos pacientes internados foi encaminhada de unidades de pronto atendimento, e apresentavam no momento da internação menos de 5 dias de sintomas, o que contraria os dados da literatura, que evoluem com agravamento dos sintomas após o 7º dia de doença14.

Foram encontrados 3 casos de recém-nascidos sintomáticos com amostras coletadas com menos de 24 horas de vida e com resultados positivos, o que indica transmissão vertical, mas faz-se necessário um estudo a parte, com uma amostra representativa para melhor estabelecer as características da doença nesse grupo.

Entre as comorbidades, a mais frequente foi doença respiratória crônica, representando 26,2% da amostra. Este achado está de acordo com estudos que afirmam que esta comorbidade representa um fator risco para complicações na COVID-1915. Um outro grupo que merece destaque é o das doenças onco-hematológicas, na amostra esse foi o 2º grupo mais prevalente, podendo esse fato ser atribuído ao comprometimento do sistema imunológico dos pacientes que se encontram em tratamento oncológico16.

O quadro clínico mais prevalente foi o respiratório, representando mais de 70% dos casos, seguido por sintomas gastrointestinais, cerca de 12% dos casos, que apareceu como caso isolado, mas, principalmente, associado aos sintomáticos respiratórios, o que já é comum em outros casos de infecções virais17. Diversos outros sinais e sintomas foram observados no grupo amostral, chamando atenção para a variabilidade da apresentação clínica da COVID-19 na pediatria. Estudos mostram que esta variação pode ter relação com o estado de saúde prévio dos pacientes, ao momento em que essa criança foi levada ao atendimento e a presença de comorbidades18. Com relação a menor gravidade e boa evolução dos casos observada na população infantil em geral, acredita-se estar relacionado à exposição mais tardia das crianças ao vírus, devido ao isolamento social e limitação ao domicílio, fazendo com que elas fossem expostas a cepas menos virulentas. Somam-se a isso, a teoria da imunidade treinada - causada pelo uso de certas vacinas para treinar a imunidade inata para adquirir memória imunológica; e o menor número de receptores da ECA2 encontrados nas crianças - os quais provavelmente permitem a entrada do SARS-CoV-2 nas células hospedeiras. Além disso, as crianças costumam apresentar menos comorbidades que os adultos e podem apresentar em sua mucosa respiratória um maior número de outros vírus, o que dificultaria o crescimento do SARS-CoV-219.

Na amostra não foram observados casos de síndrome multissistêmica inflamatória pediátrica (SIM-P), uma forma grave de reações hiperinflamatórias que se assemelha à doença de Kawasaki (DK) - vasculite febril aguda autolimitada, de etiologia desconhecida, responsável pela maior causa de cardiopatias adquiridas em países desenvolvidos. Na DK ocorre inflamação vascular que afeta predominantemente vasos de médio calibre, com predileção pelas artérias coronárias, podendo levar a aneurismas, trombose e estenose, evoluindo para infarto ou morte súbita. Mas, apesar de não serem frequentes, tais casos já foram relatados por outros serviços19,20.

No presente estudo não foram encontradas alterações relativas aos exames laboratoriais que pudessem gerar alto grau de suspeição para COVID-19. Ao observar a mediana, leucócitos globais, PCR e LDH apresentaram valores pouco acima do valor de referência; linfócitos, plaquetas, ureia, creatinina, CPK e ferritina encontraram-se normais; D-dímero foi o único marcador que se encontrou muito acima do valor de referência, justificado pelo fato de ser um produto da degradação da fibrina, e esse processo está aumentado em quadros como sepse, vasculites, traumas e outras situações de estresse e doenças inflamatórias21. Em relação aos exames de imagem, não foram encontradas alterações características nas radiografias, porém nas TC de tórax, a opacidade em vidro fosco foi observada em cerca de 65% dos casos, o que sugere infecção viral, mas não é específico da COVID-1922.

Com relação à terapia farmacológica, em mais de 50% da amostra foi utilizada azitromicina. Ceftriaxona ou amoxicilina + clavulanato foram utilizados em alguns casos devido à infecção bacteriana secundária associada, variando a forma de apresentação de acordo com o estado geral e aceitação da criança. Porém, é importante salientar que o uso irracional de antibióticos, especialmente os de amplo espectro, deve ser evitado, atentando-se sempre a real necessidade da prescrição, como nos casos de deterioração clínica dos pacientes e/ou presença de culturas positivas23. A azitromicina, um antibiótico macrolídio de amplo espectro com propriedades anti-inflamatórias, é capaz de atuar em diversos tipos de infecção, dentre elas a respiratória. Entretanto, não há evidência desses benefícios na COVID-19, não justificando, desta forma, sua prescrição no tratamento24.

Corticoides endovenosos foram prescritos para cerca de 35,4% dos pacientes, migrando assim que possível para a prednisolona via oral, que no total foi usada em 47,7% destes pacientes. Porém, o uso dessas medicações também deve ser criterioso, baseando-se na gravidade da resposta inflamatória sistêmica, no grau de dispneia, na rápida deterioração radiológica ou em outras complicações graves, como o choque séptico23. Em pacientes que necessitaram de oxigenoterapia, principalmente de ventilação mecânica, a administração precoce de dexametasona foi capaz de reduzir a duração da oferta de oxigênio e até mesmo da mortalidade24.

 

CONCLUSÃO

No presente estudo foi observado que idade menor que 3 anos e presença de doença respiratória crônica foram fatores de risco para internação hospitalar nos casos de COVID-19. Em sua maioria, as internações ocorreram até o 5º dia de sintomas, duraram em média até 7 dias e tiveram boa evolução com desfecho favorável. Houve apenas um óbito em paciente que apresentava múltiplas comorbidades.

A COVID-19 possui apresentações clínicas, radiológicas e laboratoriais variadas e, não existindo tratamento único ou específico, os casos devem ser analisados e conduzidos de forma individual.

 

CONTRIBUIÇÃO DOS AUTORES

Dayra Aparecida de Almeida Pinheiro: Conceituação, curadoria dos dados, análise formal e redação (rascunho original, revisão e edição). Eliza Lavall Bamberg: curadoria de dados, análise formal e redação (rascunho original). Ana Clara Ribeiro de Barros Pereira: Curadoria de dados, análise formal e redação (rascunho original). Fábio Videira Chagas: Curadoria de dados e análise formal. Sílvia Paschoalini Azalim de Castro: Conceituação, análise formal, redação (revisão e edição) e supervisão.

 

COPYRIGHT

Copyright© 2021 Pinheiro et al. Este é um artigo em acesso aberto distribuído nos termos da Creative Commons Atribuição 4.0 Licença Internacional que permite o uso irrestrito, a distribuição e reprodução em qualquer meio desde que o artigo original seja devidamente citado.

 

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