RMMG - Revista Médica de Minas Gerais

Volume: 26. (Suppl.5)

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Artigo Original

Diabetes mellitus em pacientes com tuberculose internados em hospital de referência em Belo Horizonte, Minas Gerais

Diabetes mellitus in patients with tuberculosis hospitalized in a reference hospital in Belo Horizonte, Minas Gerais

Nathália Palhares Rocha1; Sônia Maria Soares2; Cíntia Vieira Nascimento3; Emanuelle Rodrigues Gonçalves4; Caroline Dantas Ferreira5

1. Enfermeira. Mestre em Enfermagem. Hospital Municipal Odilon Behrens. Belo Horizoznte, MG - Brasil
2. Enfermeira. Doutora em Saúde Pública. Professora Associada. Escola de Enfermagem - EE, Universidade Federal de Minas Gerais - UFMG. Belo Horizonte, MG - Brasil
3. Enfermeira. Mestre em Enfermagem. Hospital Júlia Kubitschek. Belo Horizonte, MG - Brasil
4. Enfermeira. Belo Horizonte, MG - Brasil
5. Enfermeira.Hospital Governador Israel Pinheiro, Instituto de Previdência dos Servidores do Estado de Minas Gerais - IPSEMG. Belo Horizonte, MG - Brasil

Endereço para correspondência

Cintia Vieira do Nascimento
E-mail: cintiavieiranascimento@yahoo.com.br

Instituiçao: Hospital Júlia Kubitschek da Fundaçao Hospitalar do Estado de Minas Gerais - FHEMIG Belo Horizonte, MG - Brasil

Resumo

INTRODUÇÃO: Acredita-se que a epidemia crescente de Diabetes Mellitus é uma ameaça ao controle mundial da Tuberculose.
OBJETIVO: analisar a prevalência de Diabetes Mellitus (DM) em pacientes com Tuberculose (TB) internados em um hospital de referência para tratamento de TB em Belo Horizonte, Minas Gerais.
MÉTODO: descritivo de abordagem quantitativa, do tipo transversal. A amostra constituiu-se de 46 pacientes com diagnóstico de TB internados neste hospital, no período de agosto a dezembro de 2013.
RESULTADOS: a prevalência de DM em pacientes com TB, no período estudado, foi de 15%, sendo que destes 71% já haviam sido diagnosticados e 29% foram diagnosticados por meio do rastreamento da pesquisa. O valor médio da glicemia em jejum foi de 100,8mg/dl. Em relação à idade, a média foi de 45 anos, com predomínio do sexo masculino (80%) e estado conjugal solteiro (57%); 78% estudaram até o ensino fundamental e 41% possuíam emprego informal. Em relação à história de abandono ao tratamento, observou-se um valor de 37%, com 17% de multi-resistência. Os pacientes com TB e na faixa etária acima de 50 anos apresentaram maior risco de desenvolver DM (RP: 0,06; IC 95% 0,006 - 0,557, p-valor=0,005). Não houve casos de HIV na amostra estudada.
CONCLUSÃO: Devido a crescente importância das recomendações da Organização Mundial de Saúde (OMS) que sugerem a necessidade de estudos sobre a associação entre TB e DM, recomenda-se a criação de um protocolo para pesquisa de DM em pacientes com TB com o objetivo de rastrear pacientes sem o diagnóstico da doença e dessa forma direcionar melhor o tratamento, prevenir complicações e promover saúde.

Palavras-chave: Tuberculose; Diabetes Mellitus; Prevalência.

 

INTRODUÇÃO

A Tuberculose (TB) é considerada, ainda, um grande problema de saúde pública nos países em desenvolvimento, apesar de ser uma doença potencialmente evitável e curável.1

Em 1993, a TB foi considerada uma emergência em saúde pública pela Organização Mundial de Saúde (OMS), e esta situação perdura, considerando as dificuldades apresentadas para o seu controle em diversas localidades.

Uma das medidas de controle criadas recentemente trata-se da "Estratégia global e metas para a prevenção, atenção e controle da TB pós-2015", que objetiva reduzir a incidência para menos de 10 casos por 100.000 habitantes e a mortalidade em 95% até o ano de 2035. O desafio é aumentar a redução de novos casos, que hoje vem caindo 2% ao ano, para mais de 10% ao ano, durante os próximos vinte anos.2

No Brasil, a TB foi considerada uma das sete doenças prioritárias pelo Ministério da Saúde (MS) por ser considerada uma doença negligenciada, ou seja, aquela que prevalece em condições de pobreza e contribui para a manutenção do quadro de desigualdade, devido ser sendo um grande entrave ao desenvolvimento do país.3

Diante desse cenário e das metas mundiais para o controle da TB, surgiu a necessidade de investigar situações que favorecem o aumento do número de casos. Segundo a OMS, o diabetes mellitus (DM) é um fator que dificulta o controle da TB tal como piora o quadro clínico da doença.4

Diversos estudos têm evidenciado esta associação.5-7 Porém, no Brasil, as pesquisas sobre o tema são incipientes, reforçando a necessidade de se estudar a prevalência de DM em pacientes com TB, segundo preconizado pela OMS, com enfoque no Quadro Colaborativo de Atendimento e Controle da Tuberculose e Diabetes. Este quadro colaborativo define estratégias de rastreamento da TB em pacientes com DM e o rastreamento de DM em pacientes com TB.8

Portanto, o objetivo deste estudo foi identificar a prevalência de DM em pacientes com TB internados em um hospital de referência para tratamento de TB em Belo Horizonte (MG), Minas Gerais, bem como caracterizar estes pacientes quanto ao perfil sociodemográfico e clínico.

 

MÉTODO

Procedimento e amostra

Estudo descritivo de abordagem quantitativa, do tipo transversal, desenvolvido com 46 pacientes internados em um hospital de referência para o tratamento de TB em Belo Horizonte (MG), no estado de Minas Gerais (MG). A coleta de dados foi realizada no período de agosto a dezembro de 2013, e os participantes foram selecionados a partir dos seguintes critérios: idade igual ou superior a 18 anos; estar hospitalizado na clínica de tisiologia do referido hospital e apresentar resultado positivo para baciloscopia.

A coleta de dados foi realizada pelas pesquisadoras por meio de entrevistas individuais, consultas aos prontuários dos participantes, e coleta de exames laboratoriais (glicemia de jejum e teste de tolerância à glicose).

O tamanho da amostra foi definido por meio do teste estatístico de amostra aleatória simples para população finita, estimando-se uma proporção de DM referente à população de interesse de 23,0%, considerando o estudo de Steveson9, com poder de 80% e para um nível de significância de 5%, o que resultou em tamanho mínimo necessário de 35 pacientes.

O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa envolvendo seres humanos da Universidade Federal de Minas Gerais, parecer nº 15311/2012 e pelo Comitê de Ética da Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais - Fhemig, parecer nº 17/2012.

Coleta de material biológico

Para a identificação de DM foram realizados os exames laboratoriais de acordo com os passos estabelecidos pela OMS e pela Sociedade Brasileira de Diabetes.8,10 Os pacientes foram abordados pelas pesquisadoras, após a admissão hospitalar, para explicações quanto ao objetivo da pesquisa e convite para participação. Após a aceitação do paciente, foi realizado o exame da glicemia em jejum, e casos em que o resultado fosse superior a 100 mg/dl o teste foi repetido no dia seguinte. Quanto ao teste de tolerância oral a glicose, este foi realizado quando os dois resultados da glicemia em jejum estivesse entre 100 a 125 mg/dl. Após realização dos exames, os mesmos foram interpretados da seguinte forma: dois resultados de glicemia em jejum maior ou igual a 126 mg/dl foram classificados como caso de DM; resultado de um exame de glicemia em jejum com valor entre 100 a 125 mg/dl e o teste de tolerância oral a glicose com valor de glicemia maior ou igual a 200 mg/dl por duas horas, também foram classificados como caso de DM.

A coleta para novos exames foi realizada periodicamente, mediante confirmação de novas internações, bem como a aceitação pelo paciente em participar do estudo. Os pacientes foram orientados quanto ao jejum necessário para realização dos exames e a análise e interpretação dos resultados foram de responsabilidade dos médicos assistentes dos pacientes. Além disso, o encaminhamento do paciente para tratamento com especialista também ficou a cargo do médico assistente.

Instrumentos utilizados

Para a coleta dos dados foram utilizados dois instrumentos: questionário sociodemográfico e clínico, que foi preenchido por meio da consulta aos prontuários dos participantes, e a escala de identificação do consumo exagerado de álcool AUDIT-C, a qual foi aplicada por meio de entrevistas individuais aos pacientes.

A escala AUDIT-C foi desenvolvida pela OMS como instrumento de rastreamento para uso problemático de álcool. Em sua versão adaptada, ela foi validada pela primeira vez em populações brancas.11 As assertivas questionam a quantidade habitual consumida e a frequência de ingestao excessiva de seis ou mais copos de bebida alcoólica em um único dia. É graduado em uma escala de 0-12 (escores de 0 refletem nenhum uso de álcool). Nos homens, um escore de 4 ou mais é considerado positivo; nas mulheres, um escore de 3 ou mais é considerado positivo. Geralmente, quanto mais alto o escore do AUDIT-C, mais provável que a bebida esteja afetando a saúde e segurança do paciente.

O questionário sociodemográfico contemplou dados sobre idade, estado civil, procedência, escolaridade e situação conjugal e dados clínicos, como: índice de massa corporal (IMC), presença

do vírus da Imunodeficiência Humana (HIV), presença de tuberculose multirresistente (TB-MDR), tempo de uso do tuberculostático e outros medicamentos em uso, unidades de insulina prescritas, história de tratamento anterior para TB, hábitos de vida (tabagismo e consumo de drogas ilícitas), presença de comorbidades e história de abandono ao tratamento de TB.

Alguns critérios foram estabelecidos para o cálculo do IMC, identificação de abandono ao tratamento de TB e história de tabagismo. O IMC foi determinado por meio da razao entre o peso (em quilos) e o quadrado da altura (em metros), sendo que para interpretação dos valores considerou-se: desnutrição (< 18,5); normal (18,5 a 24,9), sobrepeso (25 a 29,9) e obesidade (> 30).12 Foi considerado história de abandono de tratamento quando o paciente deixou de tomar as drogas anti TB por mais de 30 dias consecutivos de acordo com o Plano Nacional de Controle da Tuberculose (PNCT) brasileiro.13 O paciente foi classificado como não fumante se ele nunca fumou e/ou apenas experimentou o fumo; ex-fumante se já fumou regularmente e não fuma mais há seis meses; e fumante se o indivíduo fuma regularmente um ou mais cigarros por dia.

 

ANALISE DOS DADOS

Os dados foram processados e analisados por meio do programa Statistical Package for Social Science (SPSS), versão 16.0 para Windows.

Os resultados obtidos para as variáveis independentes (caracterização sociodemográfica e clínica) foram analisadas a partir de estatística descritiva, medidas de tendência central (média, mediana) e de variabilidade (desvio-padrao) para as variáveis contínuas, e frequência relativa para as variáveis categóricas. Aplicou-se o teste Shapiro-Wilk para testar normalidade das variáveis explicativas, sendo que aquelas com distribuição normal foram apresentadas em média e desvio padrao e as demais em mediana e intervalo interquartílico (p25-p75). A variável escalar AUDIT-C foi avaliada quanto à consistência interna por meio do alfa de Cronbach.

Para identificar possíveis relações entre as variáveis de prevalência de DM, idade e sexo, foi realizado o teste qui-quadrado; como medida de risco foi calculada a Razao de Prevalência (RP) com intervalo de confiança de 95% e nível de significância de 0,05.

 

RESULTADOS

Para este estudo, atingiu-se uma amostra de 46 pacientes (n=46), durante quatro meses de coleta de dados, no período de agosto a dezembro de 2013.

A prevalência de DM em pacientes com TB, no período estudado, foi de 15%, sendo que 71% deles já tinham diagnóstico prévio e 29% foram diagnosticados através do rastreamento na pesquisa. O valor médio da glicemia em jejum foi de 100,84mg/dl.

Em relação ao índice de massa corpórea (IMC), observou-se que 50% dos pacientes apresentaram índices de desnutrição, 39% com peso normal e 11% com sobrepeso.

Os resultados encontrados mostraram que 85% dos participantes tinham idade entre 20 e 59 anos, sendo a idade média estudada de 45 anos, com predomínio do sexo masculino (80%), sendo 57% solteiros. Observou-se que 78% dos pacientes estudaram até o ensino fundamental, 4% cursaram o ensino médio e 15% eram analfabetos funcionais. Além disso, 41% dos pacientes possuem emprego informal, 84% deles são moradores da regiao metropolitana de Belo Horizonte, conforme a Tabela 1.

 

 

Observou-se que 26% dos pacientes foram encaminhados das Unidades de Pronto Atendimento (UPA'S) de Belo Horizonte e regiao metropolitana. Sendo que 70% dos encaminhamentos foram realizados por serviços terciários e 24% dos encaminhamentos realizados pela rede de atenção básica.

Verificou-se que 13% dos pacientes eram portadores de TB-MDR, confirmados com cultura ou exames de sensibilidade. Dentre estes, 83% eram do sexo feminino; 37% abandonaram o tratamento, sendo que o maior índice de abandono do tratamento foi entre os pacientes do sexo masculino (78%); além disso, 18% destes pacientes eram analfabetos funcionais e 78% cursaram até o ensino fundamental.

Quanto à relação com o HIV positivo, não foi encontrado nenhum paciente com este diagnóstico, sendo protocolo na instituição a realização do rastreamento de HIV em todos os pacientes internados com TB.

Quanto ao tratamento oferecido 65% dos pacientes faziam uso do esquema básico (RHZE) e 18% dos pacientes faziam uso de algum esquema especial, que geralmente é prescrito após resultado de testes de sensibilidade ou em casos de incompatibilidade com alguma droga dos esquemas preconizados no Programa Nacional de Controle da Tuberculose (PNCT).

Com relação ao consumo de bebidas alcoólicas, 52% dos pacientes relataram fazer uso, sendo que dos 24 consumidores de álcool, 17 alcançaram a pontuação máxima (12 pontos) no teste AUDIT-C.

Identificou-se que 22% dos pacientes afirmaram nunca terem fumado, 41% eram ex-fumantes e 35% eram fumantes.

Sobre o consumo de drogas ilícitas, 80% dos pacientes afirmaram nunca ter consumido.

Não houve história de abandono de tratamento entre os pacientes com DM, conforme demonstrado na Tabela 2.

 

 

Para os dados desta amostra, verificou-se que apenas a idade mostrou associação significativa com diabetes (p-valor < 0,05). Portanto, nota-se maior prevalência de DM entre aqueles com idade maior de 50 anos (RP: 0,06; IC 95% 0,066 - 0,557).

 

DISCUSSÃO

A prevalência de DM para esta população foi de 15%, resultado semelhante a outros estudos nacionais e internacionais.14,15 Entretanto, a maioria dos estudos de prevalência é realizada de forma retrospectiva, mediante busca em prontuários ou em fichas de notificação compulsória.6,16

Dado importante é que 29% dos diagnósticos de DM em pacientes com TB foram realizados através do rastreamento da pesquisa. Um estudo de revisão mostrou que pacientes com TB têm um risco aumentado de ter DM não diagnosticada do que a população em geral. Além disso, o tratamento da TB pode aumentar os níveis de glicose no sangue, sugerindo que a gestao integrada da TB em pessoas com glicemia alterada poderia levar a um controle mais adequado da DM.16 Portanto, a medida adotada para estes pacientes diagnosticados durante a internação foi o acompanhamento ambulatorial na própria unidade ou o referenciamento para a atenção primária.

Ainda com relação ao DM, 28,5% dos pacientes faziam uso de insulina, sendo este um marcador de gravidade para os pacientes com TB e DM, principalmente se o paciente faz uso de mais de 40 unidades de insulina por dia.6

Houve um predomínio de pacientes do sexo masculino (80%), o que corrobora com outro estudo17 que descreve o perfil sociodemográfico de pacientes com TB.

A idade média foi de 45 anos. Dados da OMS também indicam que a TB é mais prevalente entre indivíduos com esta faixa etária.1

A TB é uma doença prevalente nos grandes centros urbanos, em decorrência das condições de moradia, nível socioeconômico e maior densidade populacional. Neste estudo, 86% dos pacientes eram moradores da regiao metropolitana de Belo Horizonte, MG. Um estudo mostrou que 98,2% dos pacientes portadores de TB internados em um hospital de referência do Rio de Janeiro eram residentes desta regiao metropolitana.18

Observou-se um baixo grau de escolaridade dos pacientes, fato este que pode interferir na adesão ao tratamento da TB e suas implicações.

Parcela considerável dos pacientes internados no setor foi encaminhada das UPAS (26%) ou do próprio serviço de urgência do hospital (26%). Este dado mostra a fragilidade do serviço de saúde, à medida que a TB diagnosticada em pronto atendimento de hospitais mostra a deficiência das unidades de saúde primária em detectar precocemente esses casos na comunidade ou a preferência dos pacientes pelo atendimento nestes locais. Isto ocorre, principalmente, devido à baixa implantação dos Programas da Saúde da Família nas regioes metropolitanas, dificuldade de acesso dos pacientes a esses serviços, preferência dos pacientes por tal atendimento e/ou busca tardia de auxílio médico, assim como à existência de quadros clínicos mais graves associados a comorbidades como a DM.19

Relativo ao perfil clínico epidemiológico estudou-se a presença de comorbidades como o HIV, a história de abandono de tratamento, a desnutrição, a TB-MDR por serem situações clássicas no contexto histórico da TB no Brasil e no mundo.

Neste estudo não foram encontrados pacientes com resultado positivo para HIV, apesar de ser protocolo na instituição o rastreamento da doença para todos os pacientes internados conforme orientação da OMS.

No Brasil, o HIV positivo ainda é um problema de saúde pública, principalmente quando associado com a TB.20 Em Minas Gerais, no ano de 2010, das 866 notificações de novos casos de TB, 427 tinham o HIV como coinfecção.21

Outra comorbidade pesquisada foi desnutrição, diagnosticada a partir do IMC. Uma das principais causas de procura aos serviços de saúde quando há sintomas da TB é, dentre outros, o emagrecimento. A desnutrição pode ser considerada um fator de risco para a infecção da TB por alterar o sistema imunológico.12 Os resultados deste estudo apontaram que a média do IMC para a população estudada foi de 18 pontos, sendo que valores abaixo de 18,5 já indicam quadro de desnutrição.

Com relação a hábitos de vida, 35% dos pacientes referiram ser fumantes e 41% referiram ser ex-fumantes. Existem evidências que indicam o tabaco como fator de risco para a TB assim como para o aumento da mortalidade da mesma. Estudo de Lin22 atribuiu 17% da incidência de TB ao tabagismo.

De forma semelhante, 52% afirmaram consumir bebida alcoólica e atingiram o grau máximo no teste AUDIT C.

Com relação ao uso de drogas ilícitas, 18% da população afirmaram já ter consumido algum tipo de droga.

Nesse sentido, a TB tem se apresentado de forma preocupante entre as pessoas que fazem uso de drogas, especialmente entre aqueles que fazem uso de crack, em razao do emagrecimento rápido e alterações no sistema imunológico20, assim como sendo um fator de risco para abandono do tratamento.23

Neste estudo 37% dos pacientes tinham história de abandono do tratamento anterior à internação. Em relação à situação de encerramento dos casos de TB no ano de 2010, em Minas Gerais, 6,1% dos casos de TB foram encerrados por abandono do tratamento, esse percentual no de Brasil foi de 5%.13,21

Um grande problema relacionado ao abandono de tratamento é a seleção de cepas resistentes aos medicamentos padronizados contribuindo para o desenvolvimento da TB-MDR. O que sugere a necessidade de retomar com o acompanhamento hospitalar, mesmo conhecendo-se a vantagem do tratamento ambulatorial, visto que muitos pacientes se encontram desempregados, sem teto ou em frágil situação social.18

Nesta pesquisa, 13% dos pacientes eram TB-MDR. Dados do MS mostram que o número de casos deTB-MDR no Brasil passou de 334 casos (2001) a 646 casos (2011).13

Assim como demonstrado, a população estudada apresenta diversos fatores de risco para o desenvolvimento de TB-MDR, entre eles a baixa escolaridade e o alto índice de história de abandono de tratamento.

O tratamento da TB em pacientes com DM, na instituição, é realizado utilizando o esquema básico, RHZE (Rinfampicina, Izoniazida, Pirazinamida, Etambutol). A recomendação da OMS é que para aqueles que fazem uso de hipoglicemiantes orais, sugere-se aumentar a dose e realizar um controle rigoroso da glicemia, que deve ser mantida abaixo de 160mg/dl. Além disso, recomenda-se trocar o uso de alguns hipoglicemiantes orais pela insulina para melhorar o controle da glicemia, visto que a rifampicina diminui os efeitos desses hipoglicemiantes orais. Em casos de pacientes que utilizam insulina de forma continua, o tratamento pode ser feito utilizando o esquema prolongado, através do esquema 2RHZE/7HE.24

O perfil clínico e sociodemográfico para esta amostra de pacientes com TB chamam a atenção para os pacientes com idades mais avançadas, 86% dos pacientes tinham mais de 50 anos. Apesar da DM ser uma doença que atinge cada vez mais indivíduos jovens, a população idosa continua sendo a mais atingida.10

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os resultados do estudo sugerem a necessidade de investir na criação de protocolos e instrumentos de gestao com a finalidade de promover o manejo integrado que considere tanto a TB quanto o DM, com o intuito de aperfeiçoar as recomendações da OMS.

Pacientes com TB e diagnosticados com DM, na atenção terciária, pode nos indicar um enfraquecimento na atenção primária, no aspecto preventivo. Desta forma, sugere-se que o manejo integrado da TB e DM seja iniciado na atenção primária, onde se espera que o paciente/usuário tenha o atendimento inicial de prevenção, promoção e recuperação da saúde.

Portanto, é fundamental estudar mecanismos para oportunizar o diagnóstico de DM para os pacientes com TB considerando as influências que a comorbidade pode causar no percurso da TB e o alto percentual da população que mesmo portadora de DM somente a descobre ao aparecimento das complicações.

Destaca-se a importância de promover o fortalecimento das ações de vigilância em saúde e capacitação dos profissionais, com a finalidade de conscientizá-los sobre a relação de cada campo presente na ficha de notificação e da relevância da completitude do preenchimento para o planejamento das atividades em saúde.

Ademais, o estabelecimento de parceria ensino-serviço, como ocorreu no presente estudo, é fundamental na realização de pesquisas que possam contribuir para a formulação de políticas públicas de saúde no Brasil.

 

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