RMMG - Revista Médica de Minas Gerais

Volume: 34 e-34120 DOI: https://dx.doi.org/10.5935/2238-3182.2024e34120

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Artigo Original

Avaliação do pré-natal e os indicadores de qualidade da assistência neonatal nas maternidades do sistema único de saúde em um município de Minas Gerais

Evaluation of prenatal care and quality indicators of neonatal care in maternity hospitals of the Brazilian National Health System in a city in Minas Gerais

José Antônio Chehuen Neto1; Henrique Diorio de Souza1; Renato Erothildes Ferreira2; Arianny Hellen de Oliveira Soares3; Letícia Pifano Medeiros3; Marcely Carvalho Macedo3

1. Departamento de Cirurgia, Faculdade de Medicina, Universidade Federal de Juiz de Fora, Minas Gerais, Brasil
2. Departamento de Estatística, Universidade Federal de Juiz de Fora, Minas Gerais, Brasil
3. Faculdade de Medicina, Universidade Federal de Juiz de Fora, Minas Gerais, Brasil

Endereço para correspondência

José Antônio Chehuen Neto
Departamento de Cirurgia - Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Juiz de Fora
Juiz de Fora, Minas Gerais, Brasil
E-mail: chehuen.neto@yahoo.com.br

Recebido em: 04 Dezembro 2023.
Aprovado em: 10 Junho 2024.
Data de Publicação: 25 Fevereiro 2025.

Editor Associado Responsável:
Henrique Vitor Leite
Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais.
Belo Horizonte/MG, Brasil.

Conflito de Interesse: Os autores declaram não ter conflitos de interesse.

Fontes Apoiadoras: Não houve fontes apoiadoras.

Comitê de Ética: Número do Parecer - 2.343.195

Registro de Ensaio Clínico: Não se aplica.

URL do Preprint: Não se aplica.

Resumo

INTRODUÇÃO: A assistência pré-natal engloba procedimentos que devem ser oferecidos às gestantes, apresentando alto impacto na saúde materno-fetal. Há associação entre a qualidade da assistência à saúde da mãe e da criança na gestação e os desfechos negativos do parto, os quais formam os Indicadores de Qualidade de Assistência Neonatal.
OBJETIVO: Avaliar a associação entre a qualidade da assistência das gestantes atendidas pelo Sistema Único de Saúde (SUS) conforme a internação em Unidade de Terapia Intensiva (UTI) neonatal. Material e
MÉTODOS: Estudo transversal, prospectivo, por meio da análise de prontuários e de entrevistas a gestantes, com recém-nascidos assistidos em três maternidades do SUS de Juiz de Fora (MG), em 2017 e 2018. Foram analisados 716 nascimentos no período.
RESULTADOS: Do perfil das gestantes, 58,24% tinham entre 18 e 24 anos; 55,35% solteiras, tendo 37,35% realizado ensino fundamental completo. Sobre o exame pré-natal foi identificada alta cobertura (98,18%); 64,11% das gestantes iniciaram o atendimento no primeiro trimestre e 17,02% realizaram menos de 6 consultas. Quanto aos desfechos, encontrou-se 7,4% de internação dos recém-natos em UTI neonatal, sendo a média de permanência de 216,54 dias.
CONCLUSÃO: Conclui-se que o atendimento pré-natal nesse período em Juiz de Fora apresenta qualidade compatível com os indicadores estabelecidos pelo Ministério da Saúde e pela literatura referente a estudos brasileiros.

Palavras-chave: Unidades de terapia intensiva neonatal; Cuidado pré-natal; Morbimortalidade neonatal; Atenção primária à saúde.

 

INTRODUÇÃO

A atenção pré-natal (APN) se constitui em um conjunto de ações que são simultaneamente preventivas, promotoras de saúde, diagnósticas e curativas, acompanhando o bom desfecho da gestação para a mulher e o neonato1. Para que seja efetivo, recomenda-se que seja iniciado preferencialmente em até 12 semanas de gestação, sendo necessário garantir o acesso ao número de consultas preconizado: igual ou superior a 6 consultas2.

O exame pré-natal de qualidade deve acolher e assegurar o desenvolvimento em todas as fases da gestação, as transformações físicas e psíquicas, sem gerar impactos para a saúde materna e o neonato. Além disso, deve diminuir as taxas de mortalidade durante esse período e identificar os fatores de risco relacionados com a mortalidade materno-infantil2. Segundo dados nacionais, em 2020, cerca de 11.8% dos óbitos infantis foram originados por causas perinatais decorrentes de problemas durante a gestação, parto e no nascimento, destacando-se as infecções neonatais, hipóxia/anóxia neonatal, malformações congênitas, prematuridade e doenças sindrômicas3.

A ampliação da assistência pré-natal vem ajudando a diminuir as taxas de mortalidade materno-infantil, visto que torna possível identificar fatores de risco relacionados com a mortalidade materno-infantil4. Na literatura, há associação entre a qualidade da assistência à saúde da mãe e da criança na gestação e os desfechos negativos do parto, os quais formam os Indicadores de Qualidade de Assistência Neonatal, como, por exemplo, mortes maternas e neonatais e internações em Unidade de Terapia Intensiva (UTI). Nesse sentido, a APN relaciona-se com a prevenção de riscos na gestação, redução de complicações no parto e puerpério e redução da mortalidade materno-infantil5,6.

Nos últimos anos, acompanhando a tendência mundial, o número de leitos de UTI teve grande crescimento. Em 2018, quantificou-se em 44.253 leitos de UTI no país, sendo 19,8% de UTIs neonatais3,7. Em Juiz de Fora, segundo os dados mais recentes de 2020 do Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde (DATASUS), o número de nascidos vivos foi de 7.863, sendo que desses, 6.043 eram de mães residentes na cidade. Essa situação comprova o fato de o município ser considerado um polo em saúde, recebendo grande demanda de municípios vizinhos3.

Ademais, o recém-nascido de risco é definido como aquele que está exposto a situações em que há maior risco de evolução desfavorável, além de apresentar maior chance do que a média de mortalidade e morbidade, sendo fortemente associado à necessidade de internação em Unidade de Terapia Intensiva neonatal. Nesse sentido, são consideradas crianças de risco aquelas que apresentem critérios como baixo peso ao nascer e/ou prematuridade8. Em Juiz de Fora, em 2020, ocorreram 45 óbitos ocorridos entre 0 e 6 dias após o nascimento (sendo que 15 recém-nascidos eram considerados baixo peso ao nascer) e 24 óbitos no período de 7 a 27 dias de vida. Assim, torna-se evidente a relevância do pré-natal na prevenção de desfechos negativos3.

O presente estudo objetiva avaliar a qualidade dos procedimentos assistenciais no pré-natal em gestantes atendidas pelo SUS municipal, prospectivamente, associada com a internação de neonatos em UTI.

 

MÉTODOS

Realizamos um estudo transversal e prospectivo com a finalidade de avaliar a associação entre "qualidade da assistência pré-natal ofertada às gestantes atendidas pelo Serviço Único de Saúde do município de Juiz de Fora, Minas Gerais e número internação na Terapia Intensiva Neonatal".

A coleta de dados ocorreu nos serviços de saúde da cidade de Juiz de Fora/MG que atendem pelo SUS em suas maternidades de referência: Hospital Maternidade Terezinha de Jesus (HMTJ), Santa Casa de Misericórdia de Juiz de Fora (SCM) e Hospital Regional João Penido (HRJP). No HMTJ, os prontuários eram coletados diariamente, enquanto no SCM e no HRJP a verificação ocorreu em dias alternados devido à rotina da gestante e do recém-nascido permanecerem no hospital por pelo menos um dia.

O instrumento para coleta de dados foi um questionário desenvolvido pelos autores e preenchido a partir das informações contidas nos bancos de dados públicos de saúde: A) registros de internação da gestante e do recém-nascido, B) na certidão de nascido vivo, C) no cartão de pré-natal da gestante e D) no cartão de alta do recém-nascido.

O primeiro momento de abordagem foi na internação da parturiente, na qual a equipe de pesquisadores preencheu um formulário sobre as condições médicas da mãe e da criança desde a internação até as altas, perpassando pelo parto.

No período da internação da mãe e da criança imediatamente após o parto, incluímos a busca de informações no prontuário da gestante para obter os indicadores de qualidade de assistência neonatal de interesse da pesquisa. A partir da alta hospitalar da mãe e da criança, até os próximos 30 dias, foi realizado um seguimento prioritário da criança nos ambulatórios pediátricos do município e ativamente junto aos pais, buscando-se a ocorrência de eventos anormais, como internações e emergências médicas nesse período pós-alta hospitalar.

O levantamento incluiu todos os partos naturais e cesarianos ocorridos nas três maternidades que atendem à rede SUS em Juiz de Fora, durante o período de outubro de 2017 a março de 2018.

Como critério de exclusão foi determinada a ausência de dados completos nos formulários estabelecidos para esta pesquisa.

Todas as gestantes receberam informações detalhadas sobre a pesquisa e seus objetivos, assim como a garantia de confidencialidade de todas as informações e registros pessoas, e foram convidadas a participar da pesquisa assinando o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

Os dados dos formulários foram inseridos na plataforma web RedCap, desenvolvida para gerenciamento de pesquisas clínicas e epidemiológicas, e imputados por dupla entrada para comparação e correção de erros. Para evitar novamente a repetição de informações de uma gestante, a plataforma evitou que dados de um mesmo número de prontuário fossem somados duas vezes.

As análises descritivas dos dados validados utilizam técnicas estatísticas convencionais, apresentando os resultados com frequências absolutas e relativas, médias, medianas e desvios-padrão, dependendo da natureza do indicador.

Usamos um Modelo de Regressão de Poisson modificado com equações de estimativa generalizadas (GEEs) para estimar riscos relativos (RRs) considerando com variável dependente "admissão ou não" em UTI neonatal.

A estratégia de modelagem adotada foi "stepwise forward", partindo-se do modelo mais simples para o mais complexo. As variáveis que apresentaram valor de p<0,20 na análise univariada entraram no modelo, seguindo a ordem do valor de p de maior significância para a menor. Permaneceram no modelo final somente aquelas que apresentaram significância estatística ou ajustaram em pelo menos um dos coeficientes de regressão das variáveis que já estavam no modelo.

Por se tratar de um estudo prospectivo com a intenção de conhecer todos os nascimentos no período de seis meses, o tamanho da amostra não foi calculado a priori. Contudo, assumindo uma amostra aleatória simples, o poder (post-hoc) fornecido por esta amostra é de 89%, para um nível de confiança de 95% e Razões de Incidência da ordem de 2.

A pesquisa foi submetida e aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos em outubro de 2017, via Plataforma Brasil, sob parecer número 2.316.434 e CAAE: 70598117.9.3002.5119.

As análises foram realizadas no STATA 15 (Data Analysis and Statistical Software College Station, Texas, USA).

 

RESULTADOS

Foram levantadas informações de 716 nascimentos no período, o que se estima ser 11,8% de todos os nascimentos assistidos pelo SUS no município de Juiz de Fora. A distribuição dos prontuários coletados por maternidade está apresentada no Gráfico 1, com uma pequena predominância dos partos realizados na SC (41,5%).

 

 

O perfil médio das gestantes da amostra, Tabela 1, é caracterizado por 6,28% das gestantes com menos de 18 anos, 58,24 entre 18 e 29 anos, 31,15% entre 30 e 39 anos e 4,33% com 40 anos ou mais. Em relação à escolaridade, 19,03 eram analfabetas ou com ensino fundamental incompleto, 37,35% ensino fundamental completo, 36,19% ensino médio completo e, 7,42% possuíam ensino superior. Cerca de 55,35% eram solteiras, 42,79% casadas e 1,86% divorciadas e 25,95% procederam de outras cidades.

 

 

Sobre os Exames Pré-Natal

Foi identificada alta cobertura pré-natal (98,18%) em Juiz de Fora, sendo que, desses, 17,32% realizaram menos de 6 consultas. Cerca de 64,11% do total das gestantes iniciou o pré-natal no primeiro trimestre.

Foi observada grande variedade de modelos de cartão da gestante com diferenças quanto à presença de dados. Como mostrado abaixo (Gráfico 2), no momento da internação, 5% das gestantes não portavam a tipagem ABO-Rh. Não houve registros da dosagem de Hb/Ht em 19,7% dos cartões, do exame de urina tipo 1 em 10%, do VDRL em 2,5% e da glicemia em 7%. A testagem anti-HIV e Ultrassonografia obstétrica também não foi anotada em 1,5% e 5% dos cartões analisados, respectivamente. Com relação à idade gestacional e batimento cardíaco fetal, a ausência dessas informações nos cartões deu-se respectivamente por 1,96% e 12,3%. Estatura e edema seguem como os dados mais incompletos dos cartões das gestantes com 46,4% e 28,5%, respectivamente.

 

 

Sobre os Partos, Desfechos e Associações com Pré-Natal

Com relação ao tipo de parto, têm-se 43,99% de partos cesárea e 54,75% de partos vaginais. Quanto aos desfechos do parto, 11,31% dos recém-nascidos caracterizaram-se como pré-termo, 7,4% resultaram em internação na UTI neonatal e, por fim, 1,26% em óbito neonatal (Tabela 2). O Gráfico 3 mostra a associação entre o número de consultas pré-natal categorizadas segundo o número mínimo de consultas preconizado, entre as idades gestacionais dos recém-nascidos. Entre os prematuros, aproximadamente 26% das mães fizeram menos de 6 consultas, enquanto nos nascidos a termo 16% das mães buscaram serviço médico com menor frequência que o recomendado. Pode-se argumentar que esse efeito se deve pelo tempo menor de gestação entre as prematuras, principalmente quando a primeira consulta do pré-natal tenha ocorrido muito tarde. Cerca de 30% das gestantes fizeram a primeira consulta após a 13a semana, mas, ao se testar a associação dessa variável com a idade gestacional do nascimento, não encontramos associação.

 

 

 

 

Foram ajustados dois modelos de regressão para se estimar os efeitos de alguns indicadores no risco de internação do recém-nascido. Como a maior causa de internação é a prematuridade, qualquer efeito do pré-natal deve considerar esse fator no ajuste, o que pode fornecer uma estimativa do efeito do número de consultas, descontando-se a idade gestacional em que ocorreu o parto. Os dois modelos que melhor explicam essa relação são apresentados, e, apesar de um pouco diferentes em sua composição, reforçam o mesmo tipo de efeito.

Segundo os modelos apresentados na Tabela 3, o risco de internação do neonato na UTI segundo o tipo 1, mesmo se controlando o risco pela prematuridade, ainda se observa um aumento nesse risco de cerca de 70% quando o pré-natal não é realizado quantitativamente segundo as orientações do Ministério da Saúde, ou seja, menos de 6 consultas. A razão de incidência de internação hospitalar por prematuridade foi de 10,7.

 

 

O modelo 2 utiliza a idade gestacional em semanas, sem categorização. A cada semana gestacional que é acrescida até a data do parto, diminui o risco de internação na UTI em 20%. Descontando-se esse efeito, não fazer o pré-natal aumenta em até quatro vezes o risco de internação do neonato, ressaltando complementarmente que o número reduzido de consultas pré-natais também aumenta em cerca de 40% esse risco. Buscou-se, em modelos não apresentados no texto, incluir fatores sociodemográficos na análise dos dados das gestantes. No entanto, não foram encontradas associações estatisticamente relevantes entre os grupos. Acreditamos que a homogeneidade da população-alvo explica esse fato.

 

DISCUSSÃO

A pesquisa relaciona a influência do serviço pré-natal com a ocorrência de internação em UTI e de mortalidade neonatal, encontrando uma elevada taxa de cobertura de consulta pré-natal (98,18%). Em contrapartida, esse cenário não é encontrado em outros municípios do país, uma vez que menor percentual de mulheres recebe assistência adequada durante a gestação, contribuindo com a ocorrência de agravos e internações potencialmente evitáveis9. Ademais, 35,89% das gestantes iniciaram a assistência tardiamente, situação observada também em outras localidades brasileiras10.

No que diz respeito à cobertura pré-natal, foi encontrada uma porcentagem de 98,18%, o que contrasta positivamente com outras localidades de Minas Gerais11. Por outro lado, quando comparado a níveis de cobertura em Juiz de Fora de 2003, onde havia 99,04% de prevalência12, percebe-se que foi praticamente mantida, com melhora pontual no que tange ao primeiro trimestre. Ressalta-se que a cidade possui atualmente, em comparação com aquela época, mais duas faculdades de medicina particulares em atividade.

Além disso, 17,32% das gestantes realizaram menos de 6 consultas. Em contraste, no período de 2003, um terço (33,8%) das pacientes não compareceu ao mínimo de 6 atendimentos, incluindo 5,1% que frequentaram apenas uma ou duas consultas, mostrando uma melhora significativa na adesão das gestantes ao pré-natal12.

Como recomendado, o início da assistência às gestantes até o quarto mês de gestação foi observado em 64,11% do total de mulheres avaliadas. Quando comparado ao cenário da cidade entre 2002 e 2004, observa-se aumento significativo do atendimento inicial no primeiro trimestre10. Assim como neste estudo, em outros estados brasileiros foi observado que mais da metade das gestantes iniciaram o acompanhamento pré-natal antes da 16ª semana gestacional10. Apesar da melhoria desse parâmetro no município nos últimos 20 anos, a porcentagem de acompanhamento pré-natal adequado ainda permanece abaixo dos dados nacionais9.

Enquanto no Brasil e em Minas Gerais, em 2018, a porcentagem de gestantes com nível de escolaridade menor que 8 anos de estudo foi de 17,44% e 13,04%, respectivamente, em Juiz de Fora, a frequência de mulheres grávidas analfabetas ou com ensino fundamental incompleto foi de 19,03%9. Sabe-se que a baixa escolaridade impacta o conhecimento da mãe sobre o aleitamento materno exclusivo (AME), fator crucial para a nutrição infantil, impactando a saúde do neonato13. Nesse cenário, a educação em saúde, preconizada pelo Programa de Humanização no Pré-natal e Nascimento, tem um papel fundamental para suprir esse déficit14. Desse modo, tem-se relatado que as mães com mais instrução escolar apresentam maior permanência na prática do AME, quando comparadas às demais, devido à possibilidade de mais acesso ao suporte pré-natal e às informações sobre as vantagens do aleitamento materno, bem como sobre os cuidados com a mama durante a gestação15.

A prematuridade é a principal causa de internação em UTI neonatal, sendo a média de permanência aproximadamente 18 dias e, em casos mais graves, 216,54 dias. Além disso, Juiz de Fora apresentou uma incidência de 2,9 prematuros nascidos ao mês para cada 100 nascidos vivos, assemelhando-se aos dados do Brasil, o 10º entre os países com maior taxa de nascimentos antes de 37 semanas de gestação9. Esses dados se relacionam diretamente com o pré-natal, pois, nos casos de prematuridade, cerca de 30% das gestantes fizeram a primeira consulta após a 13a semana. Ademais, ocorre um decréscimo de 14% para 4% na prevalência de baixo peso ao nascer e/ou de parto pré-termo com o aumento do número de consultas pré-natais de 0 a 3 para 7 ou mais11.

Dessa forma, revela-se que a maior idade gestacional ao nascimento pode reduzir o tempo de permanência na UTI. Por outro lado, foi observado que o peso ao nascimento, anomalias congênitas, idade gestacional ao nascimento, etnia, sexo do recém-nascido, idade materna e score de APGAR aumentam o período de internação16.

Ademais, encontrou-se 12,6 óbitos neonatais por 1.000 nascidos vivos. Esses dados são menores que a tendência mundial da mortalidade neonatal, pois estimou-se 18,0 mortes por 1.000 nascidos vivos, evidenciando que em Juiz de Fora o número de mortes neonatais é mais satisfatório em comparação com o cenário global17.

Porém, apesar dos números positivos, muitos óbitos nessa parcela da população poderiam ser evitados. Essas mortes ocorreram principalmente por causas relacionadas à inadequação da atenção ao feto, ao recém-nascido e à mulher durante a gestação e após o parto18. Nesse sentido, é fundamental a adequação ao número de consultas preconizadas pelo Ministério da Saúde, uma vez que a probabilidade de óbito neonatal diminui significativamente à medida que aumenta a frequência do número de consultas pré-natais19.

No tocante aos fatores sociodemográficos, o estudo não encontrou associações relevantes, dada a homogeneidade da amostra. Contudo, as desigualdades sociais definem o acesso e a qualidade do pré-natal20, resultando em nascimentos prematuros e internações em UTI neonatal9. Em outra cidade brasileira, analisou-se que a maior parte dos óbitos fetais ocorreu em hospitais públicos10.

Em outro grupo cuja assistência é deficitária encontramos as gestantes adolescentes. Essa população apresenta menor cobertura de pré-natal, o que pode estar associado à falta de autonomia decisória e a estigmas sociais, tornando neces sárias estratégias diferenciadas10. Ademais, o planejamento da gravidez e a satisfação da mulher ao descobri-la também implicam os indicadores de qualidade do pré-natal11.

Como limitações, este estudo foi realizado a partir de amostra de conveniência, de forma não aleatória, a partir de dados de prontuários em formulários específicos dos serviços. Tais características diminuem o nível das evidências encontradas, sendo difícil estabelecer relações causais diretas. Ademais, estudos referentes ao tempo de ocupação dos leitos da UTI neonatal são necessários como forma de prevenção de desfechos negativos e parâmetro para gestão dos recursos.

Embora os dados apresentados tenham se mostrado positivos, em um contexto geral, ainda há grande possibilidade de aprimoramento desse cenário. Sendo assim, pode-se afirmar que o pré-natal é fundamental para orientar as mães, sendo necessário investir em medidas que incentivem o acompanhamento adequado da gestante, além de um início precoce e com atendimento multidisciplinar9.

 

CONCLUSÃO

Os dados evidenciam não haver necessidade de política pública municipal para aumentar o número de leitos de UTI neonatal em Juiz de Fora, em virtude de ter havido dados muito semelhantes de cobertura total do pré-natal, aumento da cobertura no primeiro trimestre e queda de nascimentos de baixo peso, fatores que evitam internações em UTI neonatal.

Foi identificada alta cobertura de consulta pré-natal (98,18%) em Juiz de Fora, sendo que, desses, apenas 17,32% realizaram menos de 6 consultas. Cerca de 64,11% do total das gestantes iniciou o pré-natal no primeiro trimestre.

Quanto aos desfechos do parto, 11,31% dos recém-nascidos caracterizaram-se como pré-termo, 7,4% resultaram em internação na UTI neonatal e, por fim, 1,26% em óbito neonatal. Os dados representam ótima cobertura das gestantes no pré-natal em Juiz de Fora.

 

AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem aos alunos da Faculdade de Ciências Médicas e da Saúde de Juiz de Fora (Suprema) pela contribuição na coleta de dados.

 

CONTRIBUIÇÃO DOS AUTORES

As contribuições dos autores estão estruturadas de acordo com a taxonomia (CRediT) descrita abaixo:

Conceptualização, pesquisa, metodologia & Escrita - JACN, HDS, REF. Análise estatística - REF. Contribuição para o desenvolvimento do texto e revisão bibliográfica - AHOS, LPM, MCM.

Todos os autores aprovaram o manuscrito conforme submetido.

 

COPYRIGHT

Copyright© 2023 Chehuen Neto et al. Este é um artigo em acesso aberto distribuído nos termos da Licença Creative Commons Atribuição 4.0 Licença Internacional que permite o uso irrestrito, a distribuição e reprodução em qualquer meio desde que o artigo original seja devidamente citado.

 

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